Decolonização do continente africano

 Descolonização do continente africano

O pan-africanismo foi uma ideologia que defendia a união dos povos de origem africana na luta contra o racismo e a segregação.

1. Contexto Histórico

A descolonização africana foi o processo de independência política das colônias europeias no continente africano, que ocorreu principalmente entre 1945 e 1975, após a Segunda Guerra Mundial.

O continente africano estava quase totalmente dividido entre potências europeias desde o final do século XIX, após a Conferência de Berlim (1884-1885), onde as potências — Reino Unido, França, Bélgica, Portugal, Alemanha, Itália e Espanha — repartiram o território africano sem considerar os povos locais.

Após a Segunda Guerra Mundial, a combinação de pressões internacionais, movimentos nacionalistas internos e enfraquecimento das potências coloniais levou à gradual emancipação dos países africanos.




2. Fatores que levaram à descolonização

a) Enfraquecimento das potências coloniais

  • França, Reino Unido, Bélgica e Portugal saíram fragilizados economicamente da Segunda Guerra Mundial.

  • As metrópoles não tinham mais recursos para manter exércitos e administrações em suas colônias.

b) Influência das potências emergentes

  • EUA e URSS passaram a ser as grandes potências globais e criticavam o colonialismo, cada uma por seus próprios motivos.

  • Os EUA, defensores do “direito à autodeterminação dos povos” (Carta do Atlântico, 1941), e a URSS, por oposição ideológica ao imperialismo, estimularam o processo de independência.

c) Movimentos nacionalistas africanos

  • Surgiram movimentos políticos e partidos locais, liderados por intelectuais formados nas colônias ou na Europa, que exigiam autonomia.

  • Muitos líderes foram inspirados em ideias do pan-africanismo, movimento que defendia a união dos povos africanos contra o colonialismo.

d) Ações da ONU

  • A Organização das Nações Unidas, criada em 1945, condenava o colonialismo e apoiava o direito à independência.

  • Diversos países recém-independentes passaram a pressionar por uma nova ordem internacional mais justa.


3. O pan-africanismo e o despertar político

O pan-africanismo teve papel decisivo. Suas origens remontam ao final do século XIX, mas ganhou força no pós-guerra com congressos pan-africanos e figuras como Kwame Nkrumah (Gana) e Julius Nyerere (Tanzânia).
O movimento defendia a ideia de que todos os africanos, em qualquer parte do mundo, compartilhavam uma herança comum e deveriam unir-se contra o domínio europeu.

Frantz Fanon, em “Os condenados da terra” (1961), analisou como a descolonização não era apenas um processo político, mas também psicológico e cultural — uma libertação da mente e da identidade africana após séculos de dominação.

"O pan-africanismo foi um movimento político de grande importância porque reforçou a luta antirracista na América e Europa na passagem dos séculos XIX para o XX. Em um momento onde o racismo e a segregação racial eram marcadamente presentes nas sociedades ocidentais, o pan-africanismo se estabeleceu como um movimento político que lutava contra isso, além de ter um papel fundamental na valorização da cultura e da ancestralidade africana em negros nascidos na Diáspora.

No século XX, o pan-africanismo incentivou movimentos que lutavam contra o colonialismo e pela independência dos países africanos, embora tenha fracassado no objetivo de formar uma grande nação africana que unisse todos os povos desse continente. Grandes nomes da história, como Malcolm X, foram inspirados pelos ideais pan-africanistas."

Veja mais sobre "Pan-africanismo" em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/panafricanismo.htm


4. Etapas e casos emblemáticos da descolonização

a) Primeira onda (final dos anos 1940 – década de 1950)

  • Líbia (1951): primeira colônia africana a tornar-se independente no pós-guerra.

  • Egito (1952): revolução nacionalista liderada por Gamal Abdel Nasser, que rompeu com o domínio britânico.

  • Sudão, Marrocos e Tunísia (1956): independência negociada com as potências coloniais.

  • Gana (1957): primeiro país da África Subsaariana a conquistar a independência, sob liderança de Kwame Nkrumah — símbolo do pan-africanismo.

b) Segunda onda (década de 1960)

  • A década de 1960 foi chamada de “Ano da África” (1960), pois 17 países conquistaram independência nesse período.

  • As antigas colônias francesas (como Senegal, Costa do Marfim, Mali, Níger, Togo, Chade, Gabão e outros) tornaram-se independentes, muitas vezes por vias pacíficas, em acordos com a França.

  • Já em países como o Congo Belga (atual República Democrática do Congo), a independência (1960) foi marcada por crise política, golpes e intervenção internacional.

c) A descolonização portuguesa (1974–1975)

Portugal, sob o Estado Novo de Salazar e Caetano, resistiu à independência das colônias. Isso resultou em guerras de libertação prolongadas, principalmente:

  • Angola – MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), FNLA e UNITA;

  • Moçambique – FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique);

  • Guiné-Bissau e Cabo Verde – PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde).

A Revolução dos Cravos (1974) em Portugal levou ao fim da ditadura e acelerou a independência dessas colônias (1974–1975).

d) Descolonização tardia

  • Zimbábue (1980) e Namíbia (1990) conquistaram a independência tardiamente devido à resistência de regimes brancos e ao apoio ocidental a governos minoritários.

  • África do Sul, por sua vez, manteve o regime do apartheid até 1994, quando Nelson Mandela foi eleito presidente — um marco do fim do domínio racial e colonial.


5. Conflitos e desafios pós-independência

A independência não significou liberdade plena. Os países africanos enfrentaram problemas estruturais, como:

  • Fronteiras artificiais: desenhadas pelos europeus sem considerar etnias ou tradições locais, resultando em conflitos étnicos e guerras civis (ex.: Nigéria, Ruanda, Congo).

  • Economias dependentes: herdaram estruturas econômicas voltadas à exportação de matérias-primas para a Europa.

  • Neocolonialismo: as antigas metrópoles e novas potências continuaram influenciando a política e a economia africanas por meio de investimentos e empréstimos.

  • Ditaduras e corrupção: muitos líderes nacionalistas transformaram-se em autocratas, sustentados pela Guerra Fria e por disputas entre EUA e URSS.


6. Reflexões teóricas sobre o processo

  • Frantz Fanon destacou que a libertação política sem libertação cultural mantinha a dependência colonial.

  • Albert Memmi, em “Retrato do colonizado precedido do retrato do colonizador” (1957), mostrou como o colonizador e o colonizado ficam presos em uma relação de dominação psicológica.

  • Immanuel Wallerstein, na teoria do sistema-mundo, interpreta a descolonização como uma reorganização da dependência, em que as colônias tornaram-se “periferias” de um sistema capitalista global.


7. Síntese final

A descolonização africana foi um dos maiores processos de transformação do século XX.
Ela representou:

  • o fim formal do imperialismo europeu;

  • o surgimento de dezenas de novos Estados-nação;

  • e o início de novos desafios de soberania, identidade e desenvolvimento.

Como resume Eric Hobsbawm, em “Era dos Extremos” (1994):

“O colapso dos impérios coloniais europeus foi o fenômeno mais decisivo do pós-guerra. O mundo do fim do século XX era, pela primeira vez na história moderna, um mundo essencialmente descolonizado.”

 

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